Com mais de 4 mil vinícolas espalhadas pelo seu território, a ensolarada Califórnia faz sucesso com alguns dos melhores rótulos do mundo

A geografia dos vinhos separa os países produtores da bebida em “Velho Mundo” e “Novo Mundo”. Enquanto no primeiro grupo estão países europeus, como França, Itália e Espanha, que produzem vinhos desde os primórdios tempos da cultura vitivinícola, no segundo time estão os lugares que receberam suas primeiras videiras, levadas por viajantes, há bem menos tempo. 

O maior sucesso entre os produtores de vinho do novo mundo – que inclui países das Américas, Oceania e África – é o estado norte-americano da Califórnia. As mais de 4 mil vinícolas espalhadas pelo território californiano foram responsáveis por 90% da produção de 2,43 bilhões de litros de vinho dos Estados Unidos, em 2019. São mais de 242 mil hectares plantados com uvas em todo o estado. 

Essa qualidade acima da média dos vinhos californianos pode ser explicado pelo terroir – termo francês para designar o local de plantio da uva –, formado por pequenos vales próximos da costa californiana e banhados pelo Oceano Pacífico. Cada área, com clima e solo bem particulares.

Russian River Valley

“Um dos pilares dos atributos dos vinhos californianos é o clima ‘mediterrâneo’, com muita chuva no inverno e pouca ou quase nada durante o verão. Para se obter vinhos de qualidade, é importante ter alguns meses seguidos com temperaturas com média de 10 ºC, sem chuva em excesso e, se possível, sem geadas, como é o inverno na região”, explica o sommelier do BigLar, Mario Marcio.

A produção de vinhos tem maior destaque na área de Napa Valley, região a cerca de 80 quilômetros ao norte de São Francisco. Ela é a mais antiga região produtora de vinho da Califórnia e, nos Estados Unidos, recebe o nome de American Viticultural Area (AVA). Outras regiões produtoras são Sonoma, Monterey, Santa Barbara, Mendocino, Paso Robles, Russian River Valley e Santa Cruz.

São mais de 100 castas de uvas diferentes cultivadas no estado, com sabores e aromas ressaltados a depender do lugar de plantio. Entre uvas brancas e tintas, destacam-se nas vinhas a Chardonnay e a Cabernet Sauvignon, com volumosa produção de outras, como a Pinot Gris, a Sauvignon Blanc, a Pinot Noir, a Merlot, a Syrah e a Zinfandel, que é nativa dos EUA. 

Vinícolas na região de Sonoma
A busca por um vinho californiano

A primeira tentativa de se fazer da ensolarada Califórnia uma nova alternativa ao cultivo de uvas aconteceu pouco tempo depois do descobrimento do continente americano. As variedades de uva locais, consideradas comuns, resultavam em bebidas simples e pouco saborosas. O cruzamento das uvas europeias com as videiras nativas também apresentava sérios problemas de adaptação. 

As Vitis Viníferas europeias – espécie de videira mais cultivada para a produção do vinho – tiveram o primeiro caso de sucesso em terras californianas com a missão de San Diego, fundada pelo padre franciscano Junípero Serra, em 1769, no sul do estado. O clima de calor fez sucesso com as uvas de origem espanhola, a Mission Grape. 

Mas aquela que é considerada a primeira vinícola da Califórnia é a Buena Vista, erguida em 1857, no condado de Sonoma, pelo húngaro Agoston Haraszthy. O início de seu funcionamento foi uma mudança crucial no comércio de vinhos na Califórnia, principalmente quando, alguns anos depois, Haraszthy retornou de uma viagem à Europa e coletou mais de 300 variedades de uvas que foram introduzidas na viticultura do estado.

Na década seguinte, as principais vinícolas da Califórnia, hoje conhecidas mundialmente, já estavam em funcionamento, abastecendo os principais centros dos Estados Unidos com bebida de qualidade. A praga que devastou grande parte dos vinhedos ao redor do mundo, em 1890, e a Lei Seca, que proibiu a produção e venda de bebidas alcoólicas em todo o EUA, em 1920, foram dois acontecimentos que frearam a produção de forma significativa, mas já no período da 2ª Guerra Mundial a recuperação foi alcançada. 

Mario Marcio

Sommelier do BigLar

“Um dos pilares dos atributos dos vinhos californianos é o clima ‘mediterrâneo’, com muita chuva no inverno e pouca ou quase nada durante o verão.”

  

Julgamento de Paris

Antes menosprezados pelos europeus, os vinhos do Novo Mundo tiveram a validação da sua qualidade ao vencerem competições internacionais, como o famoso Julgamento de Paris, em 1976. Na ocasião, em uma degustação às cegas, os californianos ficaram em primeiro lugar na disputa ao derrotarem alguns dos mais valorizados vinhos franceses de Bordeaux e da Borgonha. 

“Qual francês poderia imaginar que os dois vencedores seriam norte-americanos? Um Chardonnay, do Chateau Montelena, e um Cabernet, da Stag‘s Leap Wine Cellars, foram os vencedores de um concurso em que todos os jurados eram franceses. E as duas vinícolas ficam em Napa Valley. A Califórnia melhorou muito a qualidade de seus vinhos depois de 1970 e ficou mundialmente conhecida pela sua variedade e qualidade do ‘líquido sagrado’”, explica Mario Marcio.